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Como formar professores para trabalhar com metodologias ativas

Participei durante um ano, como convidado externo ao lado da professora Lilian Bacich, de um grupo de discussão com alguns coordenadores e professores do Instituto Singularidades, em São Paulo (SP), sobre como implementar o ensino híbrido de uma forma ativa.  A combinação de leituras relevantes, pesquisa sobre projetos externos inovadores, discussão, experimentação, relato e avaliação das práticas docentes foi muito rica, fez ampliar o meu repertório de metodologias e a reflexão sobre práticas, que culminou na publicação do livro Novas Metodologias para uma Educação Inovadora.

Durante minha trajetória, outra experiência de anos atrás me impactou: ver estudantes de pedagogia e licenciatura na Uniamérica, em Foz do Iguaçu (PR), estudando os conteúdos previamente numa plataforma online (aula invertida) para, em sala de aula, desenvolver projetos reais desde o primeiro ano da graduação, e com bastante contato com escolas da região.

Compartilho esses dois relatos para mostrar que a formação de docentes torna-se cada vez mais complexa e multidisciplinar, principalmente após a pandemia. Ela deve equilibrar um bom conhecimento teórico e científico com o design de estratégias híbridas de aprendizagem ativa e de avaliação multidimensional.

 “A formação de docentes torna-se cada vez mais complexa e multidisciplinar, principalmente após a pandemia”

A formação de professores para trabalhar com metodologias ativas combina vários movimentos: os tempos individuais (com maior possibilidade de itinerários formativos personalizados e forte ênfase em plataformas digitais adaptativas), a aprendizagem ativa e híbrida entre pares, o desenvolvimento de projetos reais (com áreas inter e transdisciplinares de conhecimento) e a forte ênfase na tutoria /mentoria.

Ao longo da formação, o ideal é que cada estudante tenha um mentor que o oriente nas escolhas curriculares, metodológicas, profissionais e de vida. Essa mentoria, na graduação ou na residência pedagógica, deve promover a integração entre universidades e escolas, principalmente com professores das escolas públicas.

Homologia de processos

A formação docente deve acontecer por homologia de processos, isto é, aprender ativamente da mesma forma que se pretende ensinar. A formação em metodologias ativas tem uma base de experiências bastante ampla, consolidada e com ofertas diferenciadas por diversos grupos e organizações em plataformas online, como o Porvir, que pode ser uma fonte de inspiração. Mas, para ensinar ativamente e de forma flexível, o professor precisa estar alinhado a uma formação humana, centrada no desenvolvimento de competências e de vivência de valores (não só colocados no planejamento didático).

Ninguém ensina o que não tem. Ensinar por competências e valores pressupõe que os educadores tenham desenvolvido isso em grau avançado na formação e na prática docente. Porém, isso não é fácil e rápido. O desenvolvimento de competências amplas e a mudança de mentalidade são difíceis, processos lentos e de longo prazo que exigem perseverança, continuidade e resiliência.

“Ninguém ensina o que não tem. Ensinar por competências e valores pressupõe que os educadores tenham desenvolvido isso em grau avançado na formação e na prática docente”

Ao mesmo tempo, a formação nos instrumentaliza em como mobilizar os estudantes para que encontrem ressonância e significado nos projetos que desenhamos, nos materiais que curamos, nas estratégias individuais e grupais, nas mediações e avaliações ao longo do processo. Esses projetos devem estar inseridos em um currículo mais enxuto, que distingue o que é essencial e imprescindível do que é desejável (importante, mas mais flexível).

Compartilhamento de experiências entre pares

Na formação continuada, os gestores e coordenadores também podem apoiar os docentes mais criativos e/ou empreendedores e colocá-los como tutores/mentores de colegas com mais dificuldades. Isso possibilita a construção de espaços de compartilhamento de práticas e de experimentação de estratégias. 

Os bons gestores procuram diminuir a distância entre os docentes mais avançados com os mais lentos. Ao mesmo tempo, a aprendizagem ativa envolve uma comunidade mais ampla: estudantes, famílias e organizações que apoiam as escolas. A aprendizagem ativa começa na relação entre docente e estudante, mas ela se amplia com a participação ativa de todos, até transformar a escola em uma comunidade viva de aprendizagem.

Modelo híbrido e conectado

A formação docente precisa ser desenhada em um mundo muito mais híbrido e conectado. A separação entre espaços físicos presenciais e digitais diminuiu e ganhou novas configurações – como em outras áreas da nossa vida.  Há um crescente consenso de que construiremos, a partir de agora, muitas propostas diferentes de ensinar e de aprender de formas híbridas, mais flexíveis, personalizadas e participativas, de acordo com a situação, com as necessidades e as possibilidades de cada aprendiz. As arquiteturas pedagógicas serão mais flexíveis, abertas, híbridas, personalizadas, ativas e colaborativas, com diferentes combinações, arranjos e adaptações num país com realidades muito desiguais.

Na Educação Básica, predominará a aprendizagem ativa em ambientes presenciais. Isso deve acontecer com integração – sempre que possível – de plataformas, aplicativos e atividades digitais. Continuarão os modelos mais conhecidos, como a aula invertida, rotação por estações e rotação individual. Mas, no Ensino Médio e nos anos finais do Fundamental, testaremos modelos mais personalizados e online, como os modelos flex (roteiros personalizados online com o professor por perto), a la carte (fazer um, ou mais módulos online) ou virtual enriquecido (parte presencial, parte online). A hibridização será progressiva, de acordo com a idade e o avanço do estudante no currículo e as condições de acesso das escolas, docentes e estudantes.

* Conteúdo produzido e editado pelo Porvir.


JOSÉ MORAN
Professor, pesquisador e designer de ecossistemas inovadores na Educação. Foi professor de Novas Tecnologias na USP e um dos fundadores em 1989 da Escola do Futuro, Projeto de Pesquisa da USP. Implantou e gerenciou programas de Ensino Híbrido e de Educação a Distância.  Autor de inúmeros livros e do blog Educação Transformadora.

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