A criatividade costuma ser vista como uma característica marcante da infância, mas nem sempre a escola oferece oportunidades para as crianças desenvolverem seu lado criativo. Em uma escola de Itabirito, Minas Gerais, um grupo de professoras decidiu transformar o espaço escolar em um ambiente que estimula a imaginação: de tempos em tempos, com papéis e sucata, elas criam mundos de fantasia dentro de sala de aula.
“O mais interessante é perceber o quanto eles são criativos; basta uma faísca para estimulá-los”, diz a professora Cristina Célia Braga Antunes sobre seus alunos do 1º ano do ensino fundamental. Para acender essa faísca, ela e suas colegas da Escola Municipal Laura Queiroz já inventaram uma floresta e uma praia dentro da escola neste ano letivo. E há planos para a criação de mais cenários.
A “floresta encantada” foi o primeiro micromundo que as professoras criaram no ano letivo de 2023. “Foi muito trabalho em equipe. Cortei 40 folhas em papel verde para decorar, enquanto a professora Rosana fez girafa de caixas”, relembra Cristina. Micromundo, no conceito da aprendizagem criativa, é um ambiente que encoraja a exploração e as conexões pessoais com temas e materiais facilmente disponíveis.
O conceito foi criado pelo professor e matemático Seymour Papert, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, nos EUA), no final dos anos 1960. Para ensinar matemática, ele desenvolveu um software chamado Logo, no qual os estudantes tinham que mover uma tartaruga em um plano cartesiano. O micromundo, portanto, tratava de separar do mundo, complexo e sofisticado, um subconjunto de atividades, objetos e linguagens a serem explorados. Embora o “micromundo” inicialmente tenha sido algo no universo digital, a ideia pode ser transposta para a sala de aula física, como fazem as professoras mineiras.
“O programa não apenas beneficia as crianças no presente, mas também as prepara para enfrentar os desafios do futuro, incentivando a imaginação, a inovação e a colaboração.”
A montagem do ambiente é feita com muito carinho e, claro, criatividade. As professoras arrumam tudo depois que as crianças vão para casa e, quando elas voltam no dia seguinte à escola, deparam-se com uma surpresa. Mas essa montagem é só o primeiro passo; há muita história e criação coletiva na sequência.
“No micromundo da floresta, a gente fala que é um estudioso de espécies, que caiu de um balão no meio de uma floresta encantada. Sentamos todos em volta de uma fogueira para imaginar quais bichos fazem parte dela”, descreve Cristina. Depois de muitas ideias, as crianças também põem a mão na massa e criam elas mesmas seus projetos – no caso da floresta, construíram animais.
Outra criação das docentes de Itabirito foi uma praia na escola, com areia e tudo. “Tinha uma palmeira que ninguém dizia que era feita garrafa pet”, relata. Para as crianças, a experiência foi muito interessante, até porque boa parte delas nunca foi a uma praia de verdade.
“Usamos também desenhos animados sobre o mar, vídeos de mergulhadores, e conversamos muito, para ver o que eles já sabiam sobre o mar, sobre equipamentos de mergulho”, diz. Esse trabalho, além de desenvolver a criatividade, também é ligado aos objetivos pedagógicos e à BNCC (Base Nacional Comum Curricular). “Ao falar sobre mergulho, tiveram de imaginar um submarino e fizeram experiências sobre materiais que afundam e boiam”, cita Cristina.
A abordagem tem se mostrado muito inclusiva, engajando estudantes com todos os perfis. “Tenho um aluno com extrema dificuldade de aprendizagem, que ainda precisa de acompanhamento. Mas percebi como ele é criativo, e como se destacou. Ele fez praticamente todo o projeto sozinho”, comemora.
Para Juliene Santostasi de Oliveira, consultora educacional da Faber-Castell, é inspirador ver como as professoras de Itabirito estão transformando o ambiente escolar em micromundos de imaginação, nos quais as crianças podem explorar, aprender e criar de forma ativa. “Além disso, podemos observar que essa prática tem promovido também a inclusão, permitindo que alunos com diferentes perfis participem ativamente e se destaquem em suas capacidades individuais”, ressalta.
Os resultados positivos são fruto da intensa parceria entre as três professoras, além do apoio que recebem de toda a comunidade escolar. “O programa não apenas beneficia as crianças no presente, mas também as prepara para enfrentar os desafios do futuro, incentivando a imaginação, a inovação e a colaboração”, complementa Juliene.
Dessa forma, além dos conteúdos escolares, a criatividade e a colaboração da equipe ficam de lição para as crianças.
*Conteúdo produzido e editado pelo Porvir.
Autora: Luciana Alvarez